segunda-feira, 27 de julho de 2009

OS RATOS

Adão Paiani (*)

O fato novo envolvendo o chefe de Gabinete da governadora do Estado,Ricardo Lied, essa figura que, como outros, move-se nas sombras eescaninhos do poder, como a longa manus de interesses impublicáveis daprogenitora maior do Estado, não pode e não deve ser encarado comoalgo menor. Muito ao contrário, é talvez um dos episódios mais gravesocorridos não apenas nesse governo, que tanto tem se notabilizado pelaprática quase diária de atrocidades contra a Justiça, a lei e acidadania, mas na história recente do Rio Grande.As circunstâncias de mais esse escabroso caso envolvendo agentes dogoverno que gravitam em torno de Yeda Rorato Crusius não estão sendoabordadas pela grande mídia com a abrangência que a gravidade doepisódio exige. O próprio jornal procurado pelo presidente do Detran,Sérgio Buchmann, para denunciar a tentativa de chantagem e intimidaçãoque recebeu, vem, muito a contragosto, dando um espaço mínimo para ofato e seus articulistas, e outros do mesmo grupo, oscilam entre atimidez da análise, a descaracterização do crime cometido e a falta deargumentos para reconhecer que não tem mais como omitir da opiniãopública a verdade dos fatos.A revelação que Ricardo Lied fez-se acompanhar, em sua “visita” aBuchmann, pelo superintendente dos Serviços Penitenciários, MárioSanta Maria Júnior, é a prova que faltava para chegarmos ao mandantedo delito cometido. Conhecendo Santa Maria, quadro do PSDB como Lied,posso assegurar que ele jamais o acompanharia na empreitada se nãohouvesse recebido ordem superior para isso, emanada diretamente dagovernadora do Estado, de quem partiu a tentativa de convencer atransigir em seus posicionamentos um técnico comprometido em realizaraquilo que considerava, ao assumir o cargo, interesse do governo:moralizar a autarquia. Nem Lied nem Santa Maria agiram de modopróprio.A história, já foi dito, acontece primeiro como tragédia e depois comofarsa. Ricardo Lied tem tudo para se transformar no “GregórioFortunato” de Yeda Crusius. Tem a cobertura e a cumplicidade da sua“chefe” para continuar delinquindo, e por isso transita com tantadesenvoltura em locais e situações distantes de suas atribuições. Oambiente para repetição da história está pronto e não faltará uma RuaToneleiros, um Carlos Lacerda ou um major Vaz para que ela se repitacomo farsa. Com a substancial diferença de que, ao contrário dosepisódios de 1954, esse governo não possui contra si apenasinsinuações de um ferrenho opositor, um tribuno exaltado, comoLacerda, mas um conjunto de denúncias e materialidades de crimes detoda a ordem, vindo de dentro da sua própria estrutura. E, certamente,a governadora do Estado está a uma abissal distância da estatura moralde um Vargas. Não esperemos dela qualquer gesto de desprendimento.A utilização das estruturas de segurança do Estado e de seusmecanismos, pelo atual governo, para exercer chantagem e pressãopolítica tanto contra adversários quanto para seus própriosintegrantes, denunciados por mim quando da saída do governo, se alguémainda tinha alguma dúvida, se comprovou agora. Essa prática, cujaexistência tentei levar ao conhecimento da Governadora, levou à minhaexoneração. Agora, sabe-se, que ela não apenas conhecia os fatosdenunciados, mas fazia e faz uso dessas práticas. Por isso a tentativainicial de desqualificar minhas denúncias. Por isso a tentativa de,mediante uma sindicância fraudulenta, buscar algo que pudesse colocarem dúvida minha conduta, minha dignidade pessoal e meu caráter.Seria injusto negar que dentro do governo, e mesmo em sua basepolítica de apoio, existem pessoas com grande qualificação moral, asquais têm evitado que tudo desabe como um castelo de cartas; temerosode prejuízos à governabilidade, e esse é o seu principal equívoco. Acada dia são sufocados e arrastados pela devassidão dos ratos que semovimentam, abrigados pela impunidade, com cada vez mais desenvoltura.E com eles acabarão perecendo.Enquanto isso, cercados pela omissão e pelo silêncio de tantos,perguntamos: Quousque tandem abutere, Yeda, patientia nostra?Até quando?

(*) advogado

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